Analisando o "Manual of Section": o desenho arquitetônico mais intrigante

Para Paul Lewis, Marc Tsurumaki e David J. Lewis, o corte "é muitas vezes entendido como um tipo simplificado de desenho, produzido no final do processo de concepção para descrever condições estruturais e materiais para a etapa da construção."

Esta é uma definição muito familiar para a maioria das pessoas que estudam ou trabalham com a arquitetura. Muitas vezes pensamos primeiramente na planta baixa, pois nos permite abraçar as expectativas programáticas de um projeto e fornecer um resumo das várias funções necessárias. Na idade moderna, programas de software de modelagem digital oferecem cada vez mais possibilidades quando se trata de criar objetos tridimensionais complexos, tornando o corte uma reflexão ainda mais tardia.

Com o seu Manual of Section (Manual do Corte) lançado em 2016, os três sócios fundadores do LTL architects apresentam o corte como uma ferramenta essencial no projeto arquitetônico, e vamos admitir isso, essa leitura pode fazer você mudar de ideia sobre o tema. Para os co-autores, "pensar e projetar o corte requer a construção de um discurso sobre ele, reconhecendo-o como um local de intervenção." Talvez, na verdade, precisamos entender as capacidades dos desenhos em corte tanto para usá-los de forma mais eficiente, quanto para desfrutar ao fazê-los.

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São Paulo Museum of Art by Lina Bo Bardi (1968). Published in Manual of Section by Paul Lewis, Marc Tsurumaki, and David J. Lewis published by Princeton Architectural Press (2016). Image Courtesy of LTL Architects

O livro começa destacando a singularidade do corte como uma ferramenta de representação. O corte permite a compreensão dos materiais, estrutura e lógica arquitetônica de um projeto. O corte vertical, combinado com a representação de pessoas, ajuda a identificar escala e proporção. Ele revela simultaneamente o contexto urbano, sua estrutura interna, as qualidades visuais ornamentais e o material do interior. Os autores também lembram aos leitores que cortes detalhados ajudam a resolver os problemas térmicos, técnicos e estruturais.

Ford Foundation Headquarters by Kevin Roche John Dinkeloo Associates (1968). Published in Manual of Section by Paul Lewis, Marc Tsurumaki, and David J. Lewis published by Princeton Architectural Press (2016). Image Courtesy of LTL Architects

Mas a sugestão mais fascinante do texto é a categorização dos cortes em 7 tipos que permitem aos leitores se envolverem criticamente com o corte como uma ferramenta de projeto. Estes tipos são "intencionalmente redutores" para facilitar o seu reconhecimento e dissociação. "Extrusão", "Empilhamento", "Forma", "Cisalhamento,"Fresta", "Obliquidade" e "Abrigo" cada um destacando uma estratégia de projeto diferente, que é exemplificada por cortes ampliados de conhecidos projetos construídos dos séculos XX e XXI. Os processos mistos também são descritos, mostrando como combinar vários tipos de cortes dentro de um edifício. Os autores conseguem equilibrar projetos claros e informativos com os mais intrincados e criativos, oferecendo assim uma boa visão geral da estratégia no uso de cortes.

Yale Art and Architecture Building by Paul Rudolph (1963). Published in Manual of Section by Paul Lewis, Marc Tsurumaki, and David J. Lewis published by Princeton Architectural Press (2016). Image Courtesy of LTL Architects

Curiosamente, os leitores podem avaliar a qualidade de cada projeto em relação aos cortes verticais apenas. Os autores têm evitado uso de plantas, fachadas e renders, e o uso de fotografias é mantido a um mínimo. Todos os 63 projetos estão representados em corte de um ponto-perspectiva, com a mesma vista padronizando a representação gráfica para permitir uma compreensão estritamente arquitetônica (em oposição a representacional). Este, por sua vez, traz sistemas estruturais complexos, juntamente com hierarquias espaciais sofisticadas e interações entre o interior e o exterior.

Notre Dame du Haut by Le Corbusier (1954). Published in Manual of Section by Paul Lewis, Marc Tsurumaki, and David J. Lewis published by Princeton Architectural Press (2016). Image Courtesy of LTL Architects

A seleção variada de projetos também é digna de nota. O livro mostra obras modernistas, como o Instituto Salk para Estudos Biológicos, de Louis Kahn, a Notre Dame du Haut, de Le Corbusier, a Biblioteca Seinajoki de Alvar Aalto, Igreja Bagsvaerd de Jorn Utzon e o Yale Art and Architecture Building, de Paul Rudolf. Entre os arquitetos contemporâneos destacam-se Toyo Ito & Associates, Sou Fujimoto Architects, OMA, Peter Zumthor, Herzog & de Meuron, MVRDV, Steven Holls Architects, Diller Scofidio + Renfro, Weiss/Manfredi, BIG... a lista continua. Os autores também conferem uma atenção especial aos edifícios historicamente significativos, como projeto de habitação social de Henri Sauvage 13 rue des Amiraux e Downtown Athletic Club de Starrett & Van Vleck (mais tarde celebrado em texto canônico de Rem Koolhaas, "Nova York Delirante").

The Solomon R. Guggenheim Museum by Frank Lloyd Wright (1959). Published in Manual of Section by Paul Lewis, Marc Tsurumaki, and David J. Lewis published by Princeton Architectural Press (2016). Image Courtesy of LTL Architects

Para representar esses cortes, os autores utilizaram uma incrível quantidade de documentação que varia de fotografias históricas, desenhos detalhados à documentação primária de escritórios de arquitetura contemporâneos. Cada corte também vem com uma descrição completa, e se você estiver atento aos detalhes, você vai mesmo encontrar consistência nos itens de mobiliário; não perca as cadeiras Thonet e o design de Charlotte Perriand na obra de Le Corbusier.

Taichung Metropolitan Opera House by Toyo Ito & Associates (2016). Published in Manual of Section by Paul Lewis, Marc Tsurumaki, and David J. Lewis published by Princeton Architectural Press (2016). Image Courtesy of LTL Architects

Finalmente, o Manual of Section também inclui uma pequena e coesa "História do Corte" que traz a perspectiva para o desenvolvimento histórico e uso recente dos cortes. O texto, nomeadamente, lança luz sobre o surgimento do corte no início do século XV, explicando como eles apareceram pela primeira vez como um "dispositivo analítico" para descrever as ruínas romanas. Só mais tarde, os cortes tornam-se progressivamente um "instrumento gerador" para a prática de arquitetura, nas obras de Palladio, Etienne-Louis Boullée e Eugène Viollet-le-Duc, entre outros.

United States Pavilion at Expo '67 by Buckminster Fuller and Shoji Sadao (1967). Published in Manual of Section by Paul Lewis, Marc Tsurumaki, and David J. Lewis published by Princeton Architectural Press (2016). Image Courtesy of LTL Architects

Como mostra a história, o corte sempre foi considerado um método de representação e sua importância no discurso arquitetônico ainda é, em grande parte, prejudicada. O livro tenta, com sucesso, reintroduzir os cortes dentro dos discursos teóricos; um novo livro de referência para os arquitetos.

Nota do editor: este artigo foi publicado originalmente em 16 de agosto de 2016 e atualizado em 27 de agosto de 2019.

Manual of Section por Paul Lewis, Marc Tsurumaki, e David J. Lewis publicado por Princeton Architectural Press (2016). Imagem Cortesia de Princeton Architectural Press

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Sobre este autor
Cita: Chatel, Marie. "Analisando o "Manual of Section": o desenho arquitetônico mais intrigante" [Studying the "Manual of Section": Architecture's Most Intriguing Drawing] 30 Ago 2019. ArchDaily Brasil. (Trad. Sbeghen Ghisleni, Camila) Acessado . <https://www.archdaily.com.br/br/793763/analisando-o-manual-of-section-o-desenho-arquitetonico-mais-intrigante> ISSN 0719-8906

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